A campanha Maio Laranja, que tem como principal objetivo combater o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, foi criada em 2020, em parceria do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) com o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).
O dia 18 de maio é marcado como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, em alusão ao caso de Araceli Cabrera Crespo, que foi vítima de um crime desse gênero em 1973, sendo este o motivo pelo qual o mês de maio foi escolhido para a campanha.
No ano de 2024, considerando apenas os casos de estupro, foram registrados no Acre 678 ocorrências, o que representa um crescimento de 0,15% em relação ao ano anterior. Nacionalmente, foram anotados 78.395 casos. É importante destacar que as violências sexuais vão além do estupro propriamente dito.
Para conscientizar, alertar e ensinar sobre sinais preocupantes, além de orientar sobre ações que podem ser tomadas, o ContilNet conversou com a psicóloga Samara Pinheiro para maiores esclarecimentos.
A psicóloga alertou para os principais sinais que podem indicar que uma pessoa esteja sofrendo ou que já tenha sofrido episódios de violência sexual.
“Comportamentos sexuais inadequados para a idade; conhecimento sexual avançado; masturbação compulsiva em qualquer ambiente; insistência em brincadeiras com conotação sexual; alterações comportamentais, como queda no desempenho escolar; infecções urinárias recorrentes; desconfiança excessiva em relação a adultos; fugas de casa ou de instituições; vergonha extrema acompanhada de relatos de abuso; ideação suicida, tentativas de suicídio e comportamentos autolesivos. É importante lembrar que cada criança ou adolescente reage de forma única”, explicou ela, sobre sinais de alerta para casos de abuso.
Samara Pinheiro falou sobre os cuidados necessários com as vítimas/Foto: Cedida
Sobre formas de combater esses casos, a psicóloga enfatiza que o diálogo e a educação sexual nas escolas deveriam ser as principais estratégias adotadas.
“Ainda vejo que uma das formas mais eficazes de combate é o diálogo, a conversa. Falar com a criança, de forma clara e respeitosa, sobre o corpo, explicando que existem partes íntimas que são privadas, é fundamental. E é justamente aí que a escola pode entrar como uma importante aliada nesse processo, promovendo ações de conscientização, orientações e, quando necessário, sendo também um espaço de escuta e encaminhamento para a denúncia”, reforça.
Outro ponto de atenção levantado por Samara Pinheiro diz respeito às pessoas que têm acesso às crianças e adolescentes e às suas rotinas, já que muitas das situações de abusos e violências são praticadas por pessoas próximas.
“É fundamental que os responsáveis estejam atentos a quem tem acesso à rotina da criança, sejam familiares, vizinhos, amigos ou cuidadores. Muitas situações de abuso acontecem justamente em contextos próximos e com pessoas conhecidas, o que exige ainda mais vigilância e orientação”, explica.
A psicóloga reforça ainda que o acolhimento é necessário para as crianças, lembrando que as vítimas não têm culpa pelo que sofreram.
“A primeira atitude é denunciar, dar suporte à criança e, principalmente, reforçar que ela não é culpada por esse ato. O papel da família e da escola é fundamental tanto na prevenção quanto no acolhimento das vítimas de violência sexual. A família precisa estar presente, criar vínculos de confiança e conversar abertamente com a criança sobre o corpo, os limites e o que é ou não permitido. Já a escola tem um papel educativo e de proteção: pode promover ações de conscientização, identificar sinais de abuso e acolher a escuta da criança com responsabilidade. E é essencial reforçar: a culpa nunca é da vítima”, reforça.
Os abusos podem criar sequelas que afetam a vítima na vida adulta/Foto: Ilustrativa
Ela pontua ainda que é preciso estar atento para não fazer com que a vítima reviva os momentos do abuso durante o processo de acolhimento, pois isso pode agravar os traumas.
“O que muitas pessoas não sabem é que, mesmo quando a vítima é ouvida, se isso não for feito de forma empática e respeitosa, ela pode sentir que o trauma se intensifica. Para evitar a revitimização, é fundamental criar um ambiente seguro e acolhedor, onde a vítima possa falar no seu tempo, sem pressa, e com o apoio de profissionais treinados. Além disso, garantir que o relato não seja repetido de forma desnecessária em diferentes espaços ou para diferentes pessoas também é crucial”, explicou.
Marcas para a vida toda
Samara Pinheiro pontua ainda que os impactos psicológicos em pessoas que passam por momentos de violência sexual podem perdurar por toda a vida.
“Os impactos psicológicos da violência sexual variam muito, mas alguns são bastante recorrentes: ansiedade, depressão, culpa, vergonha, dificuldades escolares, uso de substâncias psicoativas, isolamento social e comportamentos autolesivos”, disse.
Além disso, sintomas físicos também podem aparecer, como dores de cabeça, enjoos ou crises de asma, que não têm causa médica aparente, sendo manifestações psicossomáticas.
Por fim, Pinheiro reforça que as sequelas na vida adulta podem surgir em diversos formatos, mas que os mais comuns são: dificuldades em estabelecer vínculos afetivos, baixa autoestima, distúrbios sexuais e até transtornos como depressão, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático e transtornos de personalidade, como o borderline.
Além disso, esses impactos podem emergir em momentos específicos da vida, como durante o casamento, maternidade ou na construção de relações de confiança.
“O corpo guarda memórias do trauma, mesmo quando a mente tenta esquecer. Por isso, o acompanhamento psicológico é tão importante, mesmo que a violência tenha ocorrido há muito tempo”, finalizou.
Fonte: Contilnet