Trump não oferece certezas ao mercado, que dá seus primeiros recados ao republicano

Inspirado nas páginas do passado que contam a história da bonança econômica dos Estados, o presidente Donald Trump decidiu que a solução para retomar a prosperidade do seu país era isolá-lo do resto do mundo. A narrativa trumpista não explica a que ponto a riqueza e o domínio dos EUA poderiam estar em xeque com essa postura, mas, ao seu modo, o republicano atribui a perda de poder à influência da China. A resposta a esse problema não seria outra, senão a incursão em uma guerra comercial. 

O discurso não é tão complexo: se a ideia é proteger a indústria do país, a forma de conquistar essa defesa é aumentando os custos para os produtores de fora – o que, em tese, estimularia a produção local e a empregabilidade –, enfraquecendo potenciais adversários nesse conflito. China, União Europeia, México e Canadá são alguns dos principais oponentes do outro lado da trincheira inflamada por Trump. Desde então, o mundo se divide entre retaliar as taxações proclamadas por Washington e tentar estancar a sangria com mediação e ponderação.

Para ser bem-sucedido em seu plano, Trump precisará angariar um substancial apoio interno. A massa de trabalhadores do país, que se viu acolhida no discurso eleitoral que lhe dizia, em outras palavras, que a globalização lhe foi prejudicial, por ora, indica ter dado o aval a Trump. Só resultados concretos podem, no futuro, sustentar o apoio.

Os braços que carregam Trump no seu combate comercial, no entanto, não são apenas os de trabalhadores, mas também daqueles que estão no balcão de Wall Street: o chamado mercado financeiro, com seus investidores, analistas e tomadores de decisão. Outro fator nessa conta é o próprio setor produtivo dos EUA. 

Nesta semana, o mercado norte-americano experimentou movimentos importantes e deu seus primeiros recados sobre o que pensa em relação a Trump. A mensagem que o grupo fez chegar ao republicano é a de que o mercado não atura incertezas, e, habitualmente, se retrai quando não se vê seguro sobre o horizonte econômico. Não por acaso, no último mês, os dois principais índices do setor financeiro do país tiveram quedas que saltam aos olhos: 13,7% para a Nasdaq (que opera ações de tecnologia, eletrônica e informática) e 9,7% para a S&P500

A artilharia tarifária

Analistas são contundentes em reconhecer que a política tarifária promovida por Trump gera apreensão, porque pode levar a uma espécie de efeito cascata: ela desorganiza os fluxos globais de produção (e de distribuição), fazendo com que empresas e governos a se perguntem se devem retaliar os EUA ou se o melhor é buscar outros parceiros comerciais nos seus setores. 

Pesa na conta, além disso, o fato de que não há clareza sobre a duração das tarifas: elas representam uma nova ordem comercial ou servem mais como carta de negociação do governo republicano? Outra dúvida que vem e vai na cabeça de consumidores e produtores dos EUA é a seguinte: a batalha tarifária vai levar mais inflação aos EUA?

Para Trump, o horizonte é simples de enxergar. “Vai haver um pouco de dor?”, questionou o republicano, em publicação feita em fevereiro. “Talvez (ou talvez não!). Mas faremos a América grande novamente, e tudo valerá o preço a ser pago”. Nesta semana, ao ser perguntado sobre o tema, ele negou que estivesse preocupado com o risco de recessão da economia norte-americana.

A turbulência do mercado parece ainda não ter chegado ao governo e essa impressão é confirmada por outros atores de peso da política dos EUA. Scott Bessent, secretário do Tesouro, negou que estivesse preocupado com “um pouco de volatilidade ao longo de três semanas”, mudando o foco dos seus pensamentos para o que chamou de “economia real”.

Quem vai bancar o jogo?

No campo político, os republicanos – encharcados pela tempestade trumpista e pouco dispostos a saírem disso – estão longe de um enfrentamento direto com o mandatário, mas o tema ‘tarifas’ gera incômodo. A posição do líder da maioria do Senado, John Thune (Dakota do Sul) é um exemplo disso: “obviamente, estou em um lugar diferente [sobre tarifas, em relação a Trump]”, disse, “mas estou esperançoso de que as tarifas, quando atingirem seu objetivo declarado, terão sido naturalmente temporárias”.

O mercado, que se alterna entre mandar recado e avisar diretamente, aproveitou esta semana para tentar alinhar os ponteiros pessoalmente. Logo na terça-feira 11, uma centena de líderes empresariais de alto escalão se reuniram com o republicano. O tom da demanda era o de que a guerra comercial começa a trazer problemas para a confiança na economia dos EUA.

Na saída do encontro, Trump apenas confirmou os motivos das queixas. “Eles não querem pagar 25% ou o que quer que seja”, disse o republicano, se referindo a empresas importadoras. “Pode subir mais. Veja, quanto mais alto for, mais provável é que eles construam [fábricas]”, afirmou. No encontro estiveram presentes representantes de companhias como JPMorgan Chase, Apple e Cisco.

O destino final desse voo turbulento guiado por Trump é praticamente impossível de prever. Se os seus argumentos forem vencedores, a indústria norte-americana se fortalece, produtores voltam a jogar seus grãos sob o terreno norte-americano e os adversários amargam a derrota para a ‘grande América’. Se não, Trump se verá diante da força de uma ordem global que, por mais que tente, não conseguirá mais reverter. Enquanto isso, o adejo trumpista luta para atravessar nuvens carregadas.

André Lucena – Carta Capital

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